23 dezembro 2010

ANDAR, FALAR, PENSAR OS TRÊS MAIORES APRENDIZADOS DA INFÂNCIA




Inúmeros são os aprendizados que fazemos vida afora voluntária ou involuntariamente. Porém existe uma tríade que, independente da nossa vontade, temos todos que aprender: trata-se da aquisição das faculdades do ANDAR do FALAR e do PENSAR que se sucedem invariavelmente nessa direção e têm uma interdependência entre si revelando como a atividade motora tem influência formativa sobre o corpo e cria as bases para as faculdades cognitivas.
Como podemos entender isso?
A Teoria da Metamorfose reza que: “cada estágio do desenvolvimento, contém em si, todos os seus estágios precedentes”.Goethe (1749-1832).
Nesse sistema teríamos uma dependência real e progressiva dessas três etapas onde a qualidade PENSAR seria um produto do desenvolvimento do FALAR, que se atrelaria diretamente à conquista do ANDAR, R. Steiner (1861 – 1925).
O ser humano não nasce pronto como os animais; um bezerro, pouco tempo após nascido, já caminha. O homem carece de amadurecimento para conquistar essa façanha.
Ao observarmos o esforço da criança para ficar em pé e depois ANDAR, não imaginamos (ou esquecemos) o quão difícil é fazer todas aquelas repetições, cair e levantar milhares de vezes. É tanto esforço que esse processo é comparado a se tocar um instrumento musical com perfeição!
Sendo a criança pequena uma grande imitadora, ela só se ergue se houver um ser ereto por perto – ereto pelo movimento, pela atitude e também pela retidão tanto externa quanto interna.
Na busca pelo ANDAR, esse pequeno ser já pode mostrar sinais de sua personalidade, mas há que se considerar a influência marcante do meio e dos responsáveis por ele. Nesse período não se deveria colocar a criança em nenhuma posição que ela ainda não tivesse conquistado (bebê conforto, andador, etc.) É preciso respeitar o tempo dessas aquisições. A criança não deveria usar calçados até o completo desenvolvimento do ANDAR. Ela por si, deverá explorar todo o espaço físico em todas as dimensões – frente/trás/dentro/fora/direita/esquerda/cima/baixo – só assim conseguirá ir “tomando posse” de seu espaço e de seu próprio corpo.
Conforme o ANDAR vai se completando, o que acontece primeiro de lado e só depois de frente, começa um novo movimento no espaço interno, movimento este vinculado diretamente à respiração - ela vai como que deixando o seu “mundinho” próprio, sendo impulsionada a “trocar”, se relacionar com outro ser humano.
Nasce o FALAR que é diretamente proporcional à qualidade do desenvolvimento anterior – o ANDAR. Crianças que pularam etapas do andar como engatinhar, por exemplo, ou foram “escoradas” por quaisquer métodos, invariavelmente, terão dificuldades nessa fase (um exemplo comum é a gagueira).
A palavra é um poderoso formador e pode plasmar inclusive a estrutura física, por isso desde a mais tenra idade a criança deverá ouvir palavras bem pronunciadas, com concordâncias corretas, evitando todo tipo de fala infantil estereotipada tão comum e prazerosa quando nos deparamos com um lindo bebê!
A tonalidade e a modulação da voz deverão ser muito bem cuidadas ou poderemos impingir uma verdadeira “surra sonora” para a criança.
A fala da criança começa sempre pelo som das consoantes: mãmãmã, papapa, e assim vai evoluindo para formar palavras, depois as primeiras frases que já traduzem os primeiros movimentos de representações mentais que vão culminar com a terceira característica dessa tríade: o PENSAR. De inicio, esta é uma atividade simples, num espaço individual não obedecendo a nenhuma lógica. Nesse momento, essa criança deverá estar por volta do seu terceiro ano de vida e pela primeira vez, vai se auto- denominar – EU – o brinquedo é meu; eu quero isso, eu quero aquilo, demonstrando a aquisição de um amadurecimento anímico – espiritual mais avançado, sem o qual nenhuma criança conquista essa faculdade. É típico dessa fase uma atitude de oposição e negação ao mundo na tentativa de se fortalecer e desenvolver autoconsciência e auto-percepção.
Nesse momento a criança precisa de resistência e limites, o que deve ser feito de maneira sensata. Pedagogicamente pode-se vestir a criança com roupas mais justas; o que ajuda a contê-las; ou fazê-las inverter a situação que provocaram por “birra”, por exemplo – limpar o que sujou, refazer o que desfez – sempre amorosa, mas firmemente. Caso não se consiga fazer isso, essa criança poderá vir a ser um adulto que não perceberá a si mesmo - ou será “o espaçoso”, ou “o encolhido”.
O desenvolvimento do PENSAR continua em verdade pela vida toda. Nas Escolas Waldorf (método pedagógico desenvolvido por Rudolf Steiner e colaboradores em 1919) só se alfabetiza criança com seis a sete anos, obedecendo a um sinal físico dessa prontidão: a queda dos dentes; antes disso o PENSAR lógico roubaria forças que estariam à disposição da elaboração dos órgãos e sistemas.
Como propõe Piaget, o PENSAR lógico (fase cognitiva) estará pronto por volta dos doze anos. É nesse e somente nesse período que deveriam ser oferecidos os conteúdos de cunho mais abstrato e que exigem raciocínio lógico, comprovação, experiência prática como a Física e a Química. Para um bom desenvolvimento do PENSAR, especialmente pais e professores deverão apresentar os fenômenos como processos coerentes e vivos com começo, meio e fim. A criança poderá participar dos afazeres domésticos – bater um bolo, por exemplo, (importante saber que a criança não é da facilidade – ela irá preferir bater o bolo com as mãos a usar a batedeira) – ou ajudar a fazer um canteiro com ervas aromáticas, por exemplo.
São atividades simples, estimulantes e que ensinam como as coisas são feitas passo a passo e ajudam a ordenar logicamente os pensamentos. Será bem diferente se essa criança consumir somente bolos ou outros alimentos já prontos!
Podemos afirmar então que nos três primeiros anos de vida, a criança passa por uma evolução progressiva de importância vital para todo seu desenvolvimento humano posterior.
Estas seriam talvez as tarefas mais arquetípicas de todo aprendizado humano.
O ANDAR nos move, nos aproxima das pessoas, dos lugares, da natureza. O FALAR expressa, integra e socializa. O PENSAR nos liberta, e em liberdade reconhecemos nossa missão no mundo, nos dedicamos a um ideal e nos colocamos a serviço da humanidade.
Dra. Elaine Marasca Garcia da Costa é médica Pneumologista com formação em Antroposofia/Biografia Humana. Mestre em Ciências da Educação. Docente/ coordenadora do curso de pós-graduação - Antroposofia na Saúde na UNISO.


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